
-Amaro, meu filho, que é que você quer ser?
-Marinheiro. Pra viajar. Ou maquinista pra viajar também.
Mamãe sorria e continuava a bordar. Tinha uns olhos bons e um jeito todo especial de olhar para os outros. Papai falava grosso. Tinha bigodões retorcidos e uma enorme medalha de ouro presa à corrente do relógio. -Meu filho, um homem precisa fazer força para triunfar. Só os fracos é que se abatem diante da vida.
Papai dizia isto sempre, com a testa franzida, sacudindo a mão fechada no ar; e a medalha grande dançava contra o colete escuro.
Lutar... Amaro sentia arrepios. Lutar. Luta era sangue. Lutar era ferir e ser ferido. Homens que vencem e são vencidos. Mas que é o triunfo, que significa vencer? Não seria melhor ficar sempre e sempre ali, junto da mãe, na cidade natal, na rua humilde onde havia um cego que tocava concertina, um cachorro sem dono que se refestelava ao sol e um vendeiro português que pelas tardinhas...
-Posso trazer o almoço, seu Amaro?
Na sua frente, Belmira sorri com dentes alvíssimos. Amaro sacode a cabeça afirmativamente.
-Pode.
Enfim... Eram recordações boas. Tudo aquilo tinha ficado muito longe no passado. Verdade é que a gente nunca esquece a infância. Pieguices? Mas, que é que a vida pode nos oferecer de melhor, de mais puro?..."
4 comentários:
Um sopro de poesia no meu dia... Muito lindo o texto, cheiro de infância, de café com leite e bolacha maria, chão molhado e risos.
:-)
Alice, livro recomendadíssimo! O livro traz como cenário uma pensão com indivíduos de culturas diferentes tomando café da manhã, almoçando... convivendo! concomitante ao cotidiano dos moradores, Clarissa está despertando para adolescência. Magnífico! ;
"Não. O mundo ia além."
O desejo incontrolável de conhecer o mundo. De ir mais além, mais adiante...correr o mundo. Quem nunca teve?! Com certeza o livro já esta na minha lista de livros a serem lidos. Bjs!
Ruri, você vai adorar! Érico Veríssimo não te decepcionará. Beijão
Postar um comentário